NÓS ESTAMOS NOS PROVOCANDO CÂNCER!

Tradução livre do The New York Times

By RITA F. REDBERG and REBECCA SMITH-BINDMANJAN. 30 JAN. 2014

Tradução Marilia Feliciano Alamini.

 

Apesar do avanço em prevenção e tratamento, a taxa de câncer tem aumentado consideravelmente de forma que logo a doença vai ultrapassar os problemas de coração como a principal causa de morte nos Estados Unidos. Surpreendentemente, nós e muitos outros experts acreditamos que um importante culpado pode ser nossa prática médica: nós estamos silenciosamente nos irradiando até a morte.
O uso de imagens médicas com alta taxa de radiação – em particular tomografia computadorizada (CT) – subiu nos últimos 20 anos. Nossa exposição à radiação médica aumentou mais de seis vezes entre 1980 e 2006, de acordo com o Conselho Nacional de Proteção e Medidas de Radiação. As doses de radiação de um exame de Tomografia Computadorizada são 100 a 1000 vezes maiores do que Raios X convencional.

Lógico que um diagnóstico precoce através de imagens radiológicas pode salvar vidas. Mas infelizmente existe pouca evidência de resultados mostrando melhora na saúde associada com a alta frequência de realização de exames de Raios X. Existe, na verdade, evidências dos seus  malefícios.

A relação entre radiação e o desenvolvimento de câncer é bem entendido: um único exame de CT expõe o paciente a uma quantidade de radiação que, evidências epidemiológicas mostram ser causador de câncer. Os riscos têm sido demonstrados diretamente através de dois grandes estudos realizados pela Inglaterra e Austrália. No estudo britânico, crianças expostas a diversos exames de CT apresentaram potencial três vezes maior para o desenvolvimento de leucemia e câncer de cabeça. Em um estudo realizado em 2011 por Susan G. Komen, concluiu-se que a radiação recebida através da realização de imagens radiológicas e hormonioterapia, foram as causas principais para o desenvolvimento de câncer de mama. Os realizadores do estudo emitiram um alerta para que as mulheres reduzissem sua exposição a CT caso o exame seja desnecessário.

Uma vez raro, hoje os testes de tomografia tornaram-se rotina. Um em cada 10 americanos são submetidos a CT 1 vez ao ano e muitos deles realizam mais de um exame. Este crescimento é o resultado de muitos fatores, incluindo o desejo pelo diagnóstico precoce, tecnologia de imageamento de alta qualidade, alertas que são emitidos diretamente aos pacientes e o interesse financeiro de médicos e centros de imagem. Os exames de tomografia custam milhões de dólares; após fazerem o investimento, os investidores ficam cobiçados pelo rápido retorno financeiro.

Por mais que seja difícil saber quantos casos de câncer resultarão pela exposição médica a radiação, um estudo de 2009 realizado pelo Instituto Nacional de Câncer estimou que os exames de CT realizados em 2007 causarão cerca de 29 mil casos novos de câncer e 14,5 mil mortes ao longo da vida das pessoas expostas. Analisando as CT’s realizadas nos últimos anos, os novos casos de câncer podem estar na casa de centenas a milhões. De acordo com nossos cálculos, a não ser que o número médio de testes reduza, de 3% a 5% dos novos casos de câncer resultarão da exposição médica a radiação.

Nós sabemos que os testes são realizados em excesso. Mas mesmo quando são utilizados em quantidade apropriada, nem sempre são realizados da maneira menos nociva. A regra é
de que a dose seja a menor possível desde que a imagem obtida permita um laudo seguro.  Mas não existe um guia específico para aplicação de dose, e existem grandes diferenças nos protocolos entre as instituições. A dose em um hospital pode ser 50 vezes maior do que em outro.

Um estudo recente em um hospital de Nova Iorque descobriu que quase um terço de seus pacientes submetidos a múltiplos testes cardíacos de imagem receberam dose cumulativa de mais de 100 milisivert de radiação – equivalente a 5000 testes de Raios X. E no ano passado, uma pesquisa realizada por médicos nucleares, descobriram que somente 7% dos testes de estresse foram realizados utilizando protocolo, o que pode reduzir a exposição para mais de 75%.

Nos últimos anos a medicina tem feito alguns progressos na área. O Colégio Americano de Radiologia e o Colégio Americano de Cardiologia emitiu alguns documentos com critérios apropriados para ajudar os médicos a considerarem os riscos e benefícios antes de solicitarem um exame. E a indústria de seguros tem começado a administrar os benefícios da radiologia, que investiga quando um teste de imagem é necessário antes de autorizar o pagamento do mesmo. Alguns estudos tem mostrado uma diminuição na utilização dos exames por imageamento.
Mas ainda temos um longo caminho a percorrer. Felizmente nós podemos diminuir a taxa de testes por Raios X simplesmente evitando exames desnecessários e minimizando a dose quando possível. Por exemplo, os médicos do setor de emergência rotineiramente solicitam teste de CT sem ao menos consultar o paciente primeiro. Esse tipo de prática deveria ser eliminada. Um melhor monitoramento e utilização de guias poderiam ajudar. O F.D.A. (Food and Drug Administration) supervisiona a aprovação dos equipamentos, mas não mantém uma vigilância a respeito da utilização dos mesmos. Nós precisamos de padrões claros, publicados pelos  profissionais da sociedade de radiologia ou organizações como a comissão da F.D.A. Na necessidade de obtenção de alvará para realização de imagens de CT, os hospitais e as clínicas poderiam ser obrigados a registrar as doses aplicadas e garantir que elas são realmente tão baixas quanto exeqüíveis comparando as mesmas com guias.

Os pacientes também tem uma parte a cumprir. Antes de concordar com um teste de CT,eles poderiam questionar: isso me trará benefício? Eu poderei ser medicada sem a realização da CT? Existem outras opções que não envolvam radiação? Quando a CT é estritamente necessária, como a exposição a radiação pode ser minimizada?
Nem médicos nem pacientes querem voltar no tempo quando a CT não existia. Mas nós precisamos encontrar meios de usá-la sem matar as pessoas no processo.

Referência

RITA F. REDBERG., REBECCA SMITH-BINDMAN “We Are Giving Ourselves Cancer”. 2014. Disponível em: <http://www.nytimes.com/2014/01/31/opinion/we-are-giving-ourselves-cancer.html?_r=1>. Acesso em: 12 fev. 2014.

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