Força nuclear no Nordeste

NordesteLevar à sociedade, em especial a das regiões Norte e Nordeste do Brasil, os benefícios da tecnologia nuclear, desenvolvendo e disponibilizando aplicações, produtos e serviços; gerando conhecimento; e apoiando a formação de recursos humanos. Essa é a importante missão do Centro Regional de Ciências Nucleares do Nordeste (CRCN-NE), instituto da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen) sediado em Recife.

A ótica de benefícios voltados para a sociedade na região em que atua realmente não ocupa apenas o discurso do CRCN-NE, que possui uma divisão de Produção de Radiofármacos desde 2009. Entretanto, até se consolidar há quatro anos como centro produtor no Nordeste do radiofármaco fludesoxiglicose 18F, também conhecido como 18FDG e F18-FDG, o CRCN-NE percorreu certo caminho.

Segundo um dos responsáveis pela implantação da divisão de Produção de Radiofármacos (junto com Sergio Cabral e Roberto Salvi) e seu atual chefe substituto, Elias Severino Santos Nascimento, o projeto foi iniciado em 2006, época em que a Tomografia por Emissão de Pósitrons (PET, na sigla em inglês) só existia no Brasil nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro. “O maior desafio era a implantação no Nordeste. A produção de radiofármacos era monopólio do Estado (Cnen) e imperava o circulo vicioso ‘não há PET porque não há produtores de radiofármacos e não há produtores de radiofármacos porque não há tomógrafos PET’. A implantação de centros produtores fora do eixo Rio-São Paulo só poderia ocorrer por iniciativa da Cnen, e assim vieram as unidades de produção de radiofármacos do Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear (CDTN), em Belo Horizonte, e do CRCN-NE, em Recife”, explica.

Além de produzir radiofármacos, O CRCN-NE se destaca pela capacitação de profissionais para o setor nuclear brasileiro

Atualmente, o Centro Regional de Ciências Nucleares do Nordeste produz 160 doses por mês do radiofármaco F18-FDG, que é o mais utilizado para a obtenção de imagens pela técnica PET, sendo aplicado, principalmente, na área de oncologia. As doses são enviadas para sete unidades (clínicas ou hospitais) em quatro estados, abrangendo um raio de 400 quilômetros: uma no Rio Grande do Norte (Natal), uma em Alagoas (Maceió), duas na Paraíba (João Pessoa) e três em Pernambuco (duas em Recife e uma em Caruaru). Em breve, uma quarta unidade pernambucana será contemplada: o Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (HC/UFPE), que começará a operar um tomógrafo PET (existe um convênio entre CRCN-NE e UFPE). Espera-se que a novidade cause um grande impacto positivo para a população da Região Metropolitana do Recife.

As 160 doses/mês do F18-FDG fornecidas pelo CRCN-NE possibilitariam, teoricamente, a realização de 160 exames/mês. No entanto, o número de procedimentos pode ser maior. “Cada dose de F18-FDG refere-se a uma atividade de dez milicuries (10 mCi), a uma hora de intervalo para a próxima dose. Isto significa que, se a clínica solicita duas doses, devemos entregar 25 mCi, e não 20 mCi, sendo que 10mCi é administrado de imediato no primeiro paciente, para que se possa fazer o exame, restando 15 mCi a ser administrado no próximo paciente, uma hora após. Porém, devido à natureza radioativa do radiofármaco, ocorre decaimento radioativo e, após uma hora, não há mais 15 mCi, mas apenas 10mCi. Assim, no dia a dia, quando os hospitais nos pedem, por exemplo, seis doses, nós calculamos ser necessária uma quantidade de F18-FDG que represente uma atividade igual a 190mCi, para compensar o decaimento radioativo durante o intervalo entre exames, por nós padronizado como sendo de uma hora. No entanto, este tempo entre exames depende de vários fatores, tais como: peso e tamanho do paciente, qualidade do exame e velocidade do tomógrafo. É comum um hospital demandar de 30 a 40 minutos entre exames, de forma que acaba por sobrar radiofármaco e, com isto, é possível realizar mais exames que o previsto; ou seja, para uma previsão de seis exames pode-se chegar a fazer oito exames. Na prática, pode-se chegar a significar algo em torno de 200 exames/mês”, explica o chefe substituto da Divisão de Produção de Radiofármacos do CRCN-NE.

O maior desafio da instituição, hoje, é o atendimento das necessidades do mercado de modo eficiente, ininterrupto e confiável. O segundo desafio, igualmente importante, é dobrar a produção de F18-FDG. E, também atender ao mercado com outros radiofármacos. Com relação ao último desafio, Elias Nascimento informa que existem projetos para a produção, em futuro próximo, de outros radiofármacos, especialmente o F18-fluoreto de sódio ([18F] – NaF), indicado para a realização de exames de PET-CT (tomógrafo PET associado a um tomógrafo computadorizado) dos ossos, e o fluorcolina (F18-FCH), que é a colina marcada com flúor-18. Esse último radiofármaco é indicado para a realização de exames de PET-CT na área da urologia, sobretudo em câncer de próstata, sendo mais específico que o F18-FDG. “Como câncer de próstata e de mama são os que mais matam no mundo, espera-se que, em um futuro breve, esses radiofármacos específicos tornem-se de maior impacto à população”, fala.

Elias Nascimento considera uma honra trabalhar na área de engenharia nuclear, que representa tecnologia de ponta e é um nicho muito seleto. “Isso, por si só, já é mais do que suficiente para fazer com que um profissional se sinta realizado. A medicina nuclear mostra como a tecnologia nuclear é positiva”, declara, lembrando que o CRCN-NE tem um projeto de utilidade pública que divulga, na internet, os locais onde o exame de tomografia PET pode ser realizado em todo país. O site é <http://www.crcn.gov.br/siteCRCN/pet/pet.html>.

Formação de mão de obra e capacitação

A produção do radiofármaco F18-FDG é apenas uma das frentes do Centro Regional de Ciências Nucleares do Nordeste, que também se destaca por formar mão de obra e capacitar o profissional do setor nuclear brasileiro. De acordo com a responsável pela coordenação de Ensino do instituto desde 2010, Eliane Valentim, houve um crescimento gradativo na procura por estágios, iniciação científica, mestrado e doutorado de lá para cá. Enquanto em 2011 o CRCN-NE tinha 28 alunos (12 de iniciação científica, 11 de mestrado e cinco de doutorado), hoje existem 51 (18 de iniciação científica, 15 de mestrado e 18 de doutorado).

Em decorrência do aumento de profissionais emergentes que precisam de capacitação, os cursos de ações de resposta a emergências radiológicas e de física radiológica têm sido muito procurados. Nas áreas de aplicações da energia nuclear e correlatas, o CRCN-NE também oferece, periodicamente, cursos de depósitos uraníferos brasileiros, prospecção e pesquisa de urânio no Brasil e monitoração ambiental. Eles são voltados para profissionais de instituições de ensino superior, profissionais que atuam em Proteção Radiológica, Defesa Civil, Corpo de Bombeiros Militar, Vigilância Sanitária, Polícia Rodoviária Federal e médicos.

“O CRCN-NE oferece suas instalações também para a realização de estágios curriculares na área nuclear e correlatas para alunos de nível técnico e superior. Participamos de uma pós-graduação com a UFPE (Programa de Pós-Graduação em Tecnologias Energéticas e Nucleares – Proten) e com a Universidade de Pernambuco – UPE (mestrado profissional em Tecnologia da Energia). Ainda temos bolsas de iniciação científica em diversas áreas de atuação do CRCN-NE e bolsas de longa duração do Programa de Capacitação Institucional (PCI) que envolvem indivíduos de nível técnico a doutores”, detalha Eliane Valentim.

– Há projetos para produção de outros radiofármacos
Elias Nascimento

Existem oitos linhas de atuação das bolsas: aplicações e efeitos das radiações ionizantes na agricultura e em alimentos, na indústria, na saúde, no meio ambiente, nas artes e na cultura; ciclo do combustível nuclear; fusão nuclear; instrumentação nuclear; materiais e processos químicos de interesse nuclear; metrologia das radiações, dosimetria e radioproteção; reatores nucleares; e rejeitos radioativos.

A Coordenação de Ensino do CRCN-NE implementará, já em 2014, cinco cursos de capacitação para professores do ensino médio, que, assim, poderão atuar como “agentes multiplicadores na divulgação dos benefícios do uso da energia nuclear”, conforme define Eliane Valentim. Serão exploradas as áreas de radiação natural, energia nuclear e meio ambiente; aplicação das radiações ionizantes na saúde; radioproteção; monitoração ambiental (técnicas de análises); e ações de resposta a emergências radiológicas.

Além da realização de cursos e estágios curriculares, da participação em pós-graduação com universidades pernambucanas e da disponibilização de bolsas, o Centro Regional de Ciências Nucleares do Nordeste também participa do Seminário Anual de Iniciação Científica (Semic) e da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia (SNCT). No primeiro caso, o instituto apoia o crescimento acadêmico dos futuros profissionais na área nuclear e correlatas (alunos de níveis médio e superior, coordenadores de universidades e profissionais da área marcam presença) e, no segundo, expõe trabalhos com a montagem de experimentos para apreciação de estudantes de vários níveis.

“Iniciei minha trajetória como aluna de iniciação científica na área nuclear. Isso foi de extrema importância, pois serviu para desmistificar o conceito de energia nuclear que tinha na época. Em minha errônea visão, o assunto envolvia rigorosamente bomba nuclear. Com o passar do tempo, aprendi sobre o uso pacífico da energia nuclear, suas contribuições na medicina e meio ambiente. Até hoje trabalho com linhas de pesquisas visando à utilização de técnicas nucleares e isotópicas para monitorar o meio ambiente. Contribuo com a formação de recursos humanos em áreas afins à de atuação da Cnen e, assim, com a melhoria da sociedade”, finaliza.

Busca constante por segurança radiológica e nuclear

Quem for assistir a uma partida da Copa do Mundo de futebol de 2014 em Recife, capital pernambucana, poderá ficar tranquilo quanto à proteção radiológica da cidade e das regiões adjacentes, no que depender do Centro Regional de Ciências Nucleares do Nordeste. À frente da Seção de Atendimento a Emergências Radiológicas desde 2004 e coordenador da participação do instituto na Copa das Confederações de 2013 e na Copa do Mundo de 2014, Cláudio Menezes mantém um grupo de especialistas em regime de sobreaviso para atuar nas mais imprevisíveis condições e locais.

De acordo com ele, a importância do trabalho desenvolvido por sua equipe pode ser constatada pelo fato dela ser a única em Pernambuco com pessoal técnico treinado e equipado para prestar as primeiras assistências em casos de acidentes e emergências que envolvam materiais radioativos e/ou nucleares. Além dos crescentes usos de tecnologias nucleares na medicina e indústria, como no polo industrial de Suape, o setor nuclear da região pode se expandir caso o governo federal retire da gaveta o projeto da central termonuclear em Pernambuco.

Faz parte da agenda cotidiana do CRCN-NE a participação da escala do serviço de averiguação de ocorrências da Cnen; realização de palestras, cursos e treinamentos interna e externamente aos profissionais das áreas de prontoatendimento a emergências; e garantia da segurança radiológica e nuclear nos grandes eventos públicos. No entendimento de Cláudio Menezes, o primeiro e o terceiro itens são aqueles que mais apresentam benefícios práticos para a população. Em busca de aperfeiçoar a equipe profissional, alguns novos projetos também estão em pauta. “Está sendo programado um curso de resposta a emergências radiológicas e/ou nucleares para os órgãos de segurança pública e de defesa do Estado de Pernambuco, mas sem data definida. Também programamos a participação no Exercício de Aeronáutica Completo do Aeroporto Internacional dos Guararapes (Gilberto Freire) e a realização de palestras e treinamentos visando à Copa do Mundo de 2014”, revela.

 Referências

BARATA, Bernardo Mendes. Força nuclear no Nordeste. Disponível em: <http://www.aben.com.br/revista-brasil-nuclear/edicao-n-41/especial_8#noticia>. Acesso em: 09 jul. 2014.

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